A discussão sobre o futuro da agricultura em África volta a estar no palco da União Africana (UA), com a realização de uma Cimeira Extraordinária dos Chefes de Estado e de Governo sobre Programas Abrangentes de Desenvolvimento Agrícola em África pós-Malabo (CAADP), a decorrer, em Kampala, República do Uganda, de 9 a 11 deste mês.
O evento vai deliberar sobre a agenda do CAADP pós-Malabo, para considerar o projecto de estratégia e plano de acção sobre os Programas Abrangentes de dez anos com o seu projecto associado à Declaração de Kampala sobre o avanço da transformação dos sistemas agro-alimentares inclusivos de África, para o crescimento económico sustentável e prosperidade compartilhada.
A convocação dessa Cimeira Extraordinária tem como finalidade endossar o rascunho da Declaração de Kampala CAADP, que fornece uma visão abrangente para transformar os sistemas agro-alimentares de África para o período 2026-2035, assim como endossar a estratégia e plano de acção do CAADP do mesmo período, que fornece pormenores sobre como atingir os objectivos e metas no rascunho da Declaração do CAADP de Kampala.
Organizado, conjuntamente, pela Comissão da União Africana, Departamento de Agricultura, Desenvolvimento Rural, Economia Azul e Meio Ambiente Sustentável, encabeçada pela embaixadora angolana Josefa Sacko, e pela Agência de Desenvolvimento da União Africana Nova Parceria para o Desenvolvimento Africano (AUDA-NEPAD), a Cimeira Extraordinária começará com uma reunião de um dia dos ministros responsáveis pela Agricultura, Desenvolvimento Rural, Água e Meio Ambiente, marcada para a próxima quinta-feira.
Este encontro será seguido por uma sessão conjunta dos ministros da Agricultura, Desenvolvimento Rural, Água e Meio Ambiente com os ministros das Relações Exteriores, na sexta-feira da próxima semana.
As sessões contarão com duas apresentações, designadamente o rascunho da Estratégia Decenal e Plano de Acção do CAADP (2026-2035), assim como o rascunho da Declaração do CAADP de Kampala. Ambas as reuniões serão realizadas em sessões fechadas.
As sessões ministeriais serão, por sua vez, estruturadas para encorajar conversas e diálogos inclusivos e interactivos entre os ministros, bem como entre os ministros e as principais partes estratégicas interessadas.
Ao mesmo tempo, permitirá que os ministros revisem os documentos estratégicos que lhes vão chegar às mãos para sua consideração e recomendações à Assembleia.
A Cimeira dos Chefes de Estado e de Governo acontece no sábado, para endossar o Projecto de Estratégia e Plano de Acção Decenal do CAADP (2026-2035) e o Projecto de Declaração do CAADP de Kampala.
A Cimeira Extraordinária sobre a Agenda do CAADP contará com a presença de Chefes de Estado e de Governo dos Estados-membros da União Africana, ministros dos Negócios Estrangeiros, ministros e peritos responsáveis pela Agricultura (silvicultura, pescas, avicultura e pecuária), Desenvolvimento Rural, Água e Ambiente, jovens, mulheres, actores não-estatais, academia e parceiros de desenvolvimento.
Programa crucial para transformação agrícola
O Programa Abrangente de Desenvolvimento Agrícola Africano (CAADP), considerado crucial para impulsionar a transformação agrícola em toda a África, desde o seu início em 2003, é uma iniciativa continental da Agenda 2063, que visa ajudar os países africanos a eliminarem a fome e reduzir a pobreza, aumentando, deste modo, o crescimento económico por meio do desenvolvimento liderado pela agricultura.
O programa destina-se ao aumento da segurança alimentar e da nutrição, reduzir a pobreza rural, criar empregos e contribuir para o desenvolvimento económico, ao mesmo tempo em que protege o meio ambiente.
O CAADP visa, ainda, uma taxa de crescimento anual de 6 por cento no sector Agrícola, com os Estados-membros da União Africana a alocarem, pelo menos, 10 por cento dos seus orçamentos para o sector da Agricultura.
Com base na Declaração de Maputo (2003-2013), a Declaração do CAADP de Malabo de 2014 renovou o compromisso com o CAADP e estabeleceu metas ambiciosas para 2025, incluindo erradicar a fome, reduzir a desnutrição, triplicar o comércio intra-africano e construir resiliência de meios de subsistência e sistemas de produção.
A Declaração de Malabo ressaltou a importância da responsabilização mútua por meio de revisões bienais agrícolas e reconheceu o papel essencial de sectores relacionados, como infra-estrutura e desenvolvimento rural. Durante a 37ª sessão ordinária da Assembleia da União Africana, em Fevereiro do ano passado, os Chefes de Estado e de Governo expressaram preocupação de que o continente não está no caminho certo para atingir as metas e objectivos do CAADP de Malabo até 2025.
Isso estimulou um apelo para o desenvolvimento de uma agenda pós-CAADP de Malabo, para construir sistemas agro-alimentares resilientes. É neste contexto que a Cimeira Extraordinária da Assembleia da União Africana de Chefes de Estado e de Governo está programada para decorrer de 9 a 11 deste mês, em Kampala, Uganda.
África gasta por ano entre 45 e 50 biliões de dólares com importação de alimentos
A comissária da União Africana para a Agricultura, Desenvolvimento Rural, Economia Azul e Meio Ambiente Sustentável, a embaixadora angolana Josefa Sacko, revelou, ontem, em exclusivo ao Jornal de Angola, que o continente africano chega a gastar, anualmente, entre 45 e 50 biliões de dólares só com a importação de alimentos.
A diplomata ao serviço da União Africana disse que o continente africano tem tudo para colocar fim a este quadro, tendo destacado a sua riqueza hídrica, terras aráveis e a população maioritariamente jovem. "Não podemos continuar a depender das importações. Nós temos possibilidade de produzir no nosso continente, no qual temos 75 por cento de terras aráveis não cultivadas, em termos globais, para atingirmos a autossuficiência alimentar, mas, para tal, tem de haver engajamento político", defendeu Josefa Sacko, adiantando que a Cimeira Extraordinária dos Chefes de Estado e de Governo sobre Programas Abrangentes de Desenvolvimento Agrícola em África pós-Malabo vai ser decisiva para o futuro da agricultura no continente.
A diplomata angolana, que se encontra em fim de missão na União Africana (o mandato termina no dia 15 de Março), referiu que a Declaração de Kampala, a ser adoptada pelos Chefes de Estado e de Governo nesta Cimeira Extraordinária, vai permitir ao continente africano ter políticas públicas comuns, para ultrapassar este problema de insegurança alimentar e nutricional.
A falta de um alinhamento das políticas públicas voltadas à agricultura, disse Josefa Sacko, tem-se apresentado como uma das barreiras para o alcance de grandes resultados a nível do continente.
"Se não alinharmos com as políticas públicas e se elas não estiverem bem definidas, não vamos chegar à segurança alimentar", alertou Josefa Sacko, para quem, além deste problema, está a falta de financiamento dos projectos. "Podemos ter um bom projecto, mas se não tivermos fontes de financiamento não o conseguimos executar", aclarou.
A comissária da União Africana para a Agricultura, Desenvolvimento Rural, Economia Azul e Meio Ambiente Sustentável deu a conhecer que, durante a apresentação, no ano passado, do relatório bienal do CAADP aos Chefes de Estado, ficou patente que os países devem continuar a trabalhar para atingirem resultados mais satisfatórios.
Apesar deste quadro menos abonatório, Josefa Sacko fez saber que 28 países fizeram progressos nos sete compromissos adoptados pelos Chefe de Estado na Declaração de Malabo. "Angola não faz parte dos 28 países que fizeram progressos, mas, ainda assim, está a fazer progressos e participa, activamente, nas discussões", frisou a diplomata angolana, para quem as alterações climáticas, os conflitos e a falta de financiamento estiveram entre os factores que contribuíram para que os países não chegassem mais longe.
Fonte: Jornal de Angola - 04 de janeiro de 2025
Fonte: Jornal de Angola - 04 de janeiro de 2025