Num momento em que se fala tanto da diversificação da economia, do valor dos produtos feitos em Angola e da importância de exportar com mais qualidade e escala, é urgente resolver um entrave técnico que está a causar sérios constrangimentos a dezenas de empresas angolanas: a indefinição sobre a operacionalização do código de barras com sufixo 606, atribuído a Angola pela GS1 Internacional.
Este número, que à primeira vista parece apenas um detalhe técnico, representa muito mais do que isso: é a identidade de origem dos nossos produtos no mercado global. Quando um consumidor, distribuidor ou retalhista olha para um código de barras, é ele que sinaliza de onde vem o produto — e Angola ainda não tem, na prática, esse reconhecimento activo, apesar do código já estar atribuído.
Neste momento, as empresas que produzem localmente — muitas vezes com grande esforço, criatividade e resiliência — não conseguem registar os seus produtos com um código de barras angolano porque falta uma assinatura institucional. É apenas um passo formal, mas que está a travar negócios, exportações e até a entrada em redes de distribuição.
Mais grave ainda: alguns produtos 100% produzidos em Angola (em muitos casos, só com a tampa importada) acabam por circular com códigos de outros países, como Portugal ou África do Sul. Isso não só invisibiliza o esforço dos nossos empreendedores, como também retira valor ao selo "Feito em Angola" num mundo onde a rastreabilidade e a origem são cada vez mais importantes para o consumidor.
Trabalho no terreno, com resultados visíveis
Nos últimos anos, temos acompanhado e promovido dezenas de projetos agroalimentares e gastronómicos em Angola — de mel, jindungo, temperos, café, chás, bolachas, compotas, farinhas tradicionais, bebidas e produtos de cosmética natural — com qualidade reconhecida e diferenciação que poderia posicionar o país como referência em nichos de valor acrescentado.
O que falta? Estrutura e apoio institucional que acompanhe o dinamismo que já existe no terreno.
A operacionalização do código 606 e a sua gestão em território nacional não são apenas uma questão técnica. São uma declaração de soberania económica, de apoio ao sector produtivo nacional, de confiança nos nossos empreendedores.
Não basta dizer “consuma nacional” — é preciso dar-lhe nome e número.
Resolver este impasse é dar um passo decisivo para:
- Identificar o que é angolano de forma oficial e universal;
- Fortalecer a marca Angola no mundo;
- Facilitar exportações e parcerias;
- Promover cadeias de valor com identidade própria.
Se já conseguimos criar produtos únicos, marcas com propósito e processos de produção alinhados com boas práticas, então é tempo de termos o número que nos representa.
O 606 é de Angola. Falta apenas que Angola o assuma como seu.
Quinta - feira, 05 de Junho de 2025
Fonte:
Teresa Margarida Freitas
CoFounder AgriHeroes